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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Na hora do meu lanche, ontem, Silvia amassou duas bananas e entregou uma colher de chá para Clara ajudar a dá-las para mim. Tive de tomar cuidado para a colher não ir até a garganta e me esforçar para reter o alimento na boca. Clara achou muito divertido.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Cortei os cabelos e fiz a barba na sexta. Na manhã seguinte, fomos a uma loja de roupas para crianças, Silvia entrou com sua filha mais nova e me deixou no carro com Clara, que começou a chorar. Duas ou três funcionárias saíram para tentar consolar Clara, ao voltar para a loja uma quis saber se esta é filha de Silvia e, referindo-se a mim, perguntou “ele também é teu?”, ao que Silvia respondeu “sim, é meu marido” deixando a figura desconcertada. Pensei que esse tipo de situação não fosse mais acontecer, pois vejo os sinais da minha idade aparecendo no espelho e em fotos. Caí na gargalhada e, quando expliquei que o motivo foi estar de cabelo curto, Silvia falou que não vai mais me deixar cortá-lo
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
A cama na qual Silvia e eu dormimos é muito alta, se um bebê cair dela vai se machucar gravemente e Silvia diz reiteradamente para suas filhas não botarem Clara em cima. Ontem depois do almoço, embora assistindo um jogo de vôlei masculino fiquei atento a Clara, percebi que as três foram ao nosso quarto e que suas irmãs falavam num tom abaixo do normal que, intuí, era de quem sabia estar fazendo algo errado e, não sei porquê, suspeitei que estavam colocando Clara na cama. Engatinhei até lá, vi que minha suspeita era fundada, reclamei, sua irmã mais nova insistiu que não a deixaria cair, Silvia foi atrás de mim e afastamos o perigo.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Pela primeira vez, Clara está fazendo questão pela minha presença fora do horário de dormir. Às vezes ela me chama e, quando já estou ao seu lado, reclama, chora se eu tentar ir fazer outra coisa. Além de ser uma alegria para mim, isso tem reduzido bastante a carga de Silvia.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
O tom triste do último post teve o propósito de quebrar o triunfalismo excessivo que, senti, estava dando ao blog e que contraria o que acabou sendo o meu principal objetivo de mantê-lo – humanizar as pessoas com paralisia cerebral. Afinal todo mundo enfrenta revezes no cotidiano.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Hoje de manhã, sentei no chão ao lado de Clara para vermos vídeos do Youtube, ela se levantou, pegou minhas mãos para dançar comigo, fiquei numa posição instável, virei para trás e a derrubei – nada sofri, enquanto ela bateu a cabeça na porta corrediça de um móvel sem maiores consequências. Clara foi chorando até a escola e Silvia acha que foi porque me viu cair, não por ter batido a cabeça. Como às vezes digo neste blog, sempre há o risco da descoordenação motora me levar a machucá-la, embora esta, creio, tenha sido só a quarta vez que isso aconteceu. O que era algo emocionante acabou mal e me chateei muito.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Ouço a estranha frase “você (ou ele) não dá trabalho” dos meus familiares há não sei quanto tempo, talvez desde que tinha 25 ou 30 anos. Tomada literalmente, é infundada porque me alimentar, banhar, vestir, etc, implica em trabalho. Até recentemente, imaginava que trazia implícita uma comparação com as crianças, que frequentemente fazem birra. Há décadas, meus irmãos e eu nos preocupamos com como fariam para cuidar de mim e da minha irmã que tem deficiência quando nossos pais não estivessem mais vivos, questão que vem voltando à tona, para animá-los venho dizendo que o problema está resolvido no que me refere, ao que meu irmão respondeu que cuidar de mim tem aspectos prazerosos e divertidos – creio que Silvia diria o mesmo, inclusive porque sua expectativa inicial era que eu fosse um chato no cotidiano. De fato, faço o máximo para facilitar a vida do cuidador do momento, sou paciente, bem-humorado, tolerante, sem hábitos muito rígidos, etc – essas e outras características beneficiam minha convivência com os outros. Mas dou trabalho, sim.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Clara não voltou mais a me abraçar espontaneamente após a última sexta-feira, o que reforça a hipótese de que soube que era meu aniversário e indica que já possui um senso de tempo que os bebês não têm. Meses antes, sua madrinha tinha dito que ela é superdotada, achei um exagero, e agora insistiu na ideia, ainda sem me convencer. Será que Clara vai ser física e estudar a natureza do tempo?
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Hoje é meu aniversário e o de casamento dos meus pais, que se casaram um ano antes do meu nascimento. Fico triste por não estar em Recife e sobretudo pela situação difícil em que estão, além dos possíveis desdobramentos – nesta semana, até tive de intervir pelo WhatsApp para resolver um problema específico, a pedido do meu irmão. Porém, acho que se sentem recompensados quanto a mim, pois superei todas suas expectativas.
De manhã, do nada Clara me deu um abraço – o melhor que poderia receber hoje –, depois me acariciou e fiquei pensando se percebeu que é meu aniversário. Ela deve ter uma ideia do que é aniversário pela experiência da escola e daqui de casa e talvez ouvido Silvia falar do meu, mas bebês não têm senso de tempo e, naquele momento, ela ainda não havia visto alguém, inclusive a mãe, me parabenizar. Se Clara teve tal percepção, não sei como foi.