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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Hoje faz 4 anos que Silvia e eu nos conhecemos no aeroporto de Curitiba – esta foi nossa primeira foto juntos. Pensar que estou vivendo com essa mulher linda e maravilhosa ainda me dá uma sensação de surrealidade.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
O amadurecimento de pessoas com paralisia cerebral pode ser severamente limitado, até totalmente bloqueado, pela família e, em especial, a mãe devido à superproteção – o principal motivo –, dúvidas quanto à sua cognição e seu equilíbrio psíquico, dificuldades psicológicas dos familiares, etc. Vou ilustrar tal questão com a manutenção da minha saúde, mas poderia dar muitos outros exemplos.
Nas crises de asma e outros problemas respiratórios na infância e na adolescência, minha mãe me salvou a vida inúmeras vezes. Isso gerou uma excessiva autoconfiança quanto à sua habilidade de manter saudáveis os filhos, traumatizou-a e meu sistema cardiorrespiratório foi se tornando seu foco quase exclusivo como se problemas em outras partes do meu corpo não pudessem ser graves, tudo agravado por crenças erradas sobre saúde. Em 1981, as doenças respiratórias começaram a diminuir drasticamente graças à natação, em 1988 quase morri afogado num clube (não era onde nadava regularmente), eu saia da piscina – que não era coberta nem aquecida – com a ponta dos dedos arroxeada, ela apresentou problemas circulatórios, cismou que eu também os tinha apesar de insistir que a causa da cianose era o frio, passou a me dá seus três remédios para circulação e, embora já tivesse 24 anos, demorei muito para me recusar a toma-los, como um menino que não sabia confrontar a mãe. Em seguida, ela me tirou da natação sub-repticiamente sem grande oposição minha e, até voltar em 2005, essas doenças recrudesceram. Na primeira gastrite que tive, em 1998, demorei 24 horas para convencê-la a me levar a uma emergência hospitalar e só consegui ao vomitar sangue. Foi apenas em torno de 2010, já com 46 anos, que tive a atitude de “cuido da minha saúde” e então passamos a brigar por essa causa, embora dissesse que ela não poderia saber o que acontecia no meu corpo mais do que eu mesmo – no fim, para reduzir os atritos simplesmente ignorava o que ela dizia a respeito. Não tem nexo responsabiliza-la por tais incidentes, pois todos ocorreram quando eu já era adulto.
Uma namorada virtual me contou que, ao estagiar numa clínica de reabilitação, conheceu um rapaz de 17 anos, com paralisia cerebral sem deficiência cognitiva, que ainda usava fraldas porque a família o achava incapaz de aprender a controlar os esfíncteres. Não cheguei a tanto, talvez porque meu pai se preocupava em reduzir minha dependência, eu ter muita autocrítica, sei lá mais o quê. Quem ler este blog, sabe que moro a 3000km da família, casei e tenho uma filha, deve pensar que represento o oposto desse rapaz. Não foi o caso, meu amadurecimento se arrastou demais, frequentemente eu era um babaca.
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Nos últimos anos que morei em Recife, as empregadas dividiam meus irmãos e eu em dois grupos, os bagunçados e os organizados, e me colocavam neste – de fato, meu quarto ficava arrumado a maior parte do tempo. Não tinha ilusões que conseguiria o mesmo ao vir morar em Curitiba – durante nosso curto namoro, Silvia deixou meu quarto caótico quando foi me encontrar em Recife Apesar de me incomodar, não vale a pena reclamar da bagunça daqui exceto nas ocasiões em que se torna repetidamente um obstáculo às minhas atividades – aí realmente fico de cabeça quente. Tudo que posso fazer, inclusive várias vezes por dia, é ficar apanhando o lixo para botar no cesto, guardando os brinquedos das meninas – um por um, pois não tenho coordenação motora para pegar vários simultaneamente – e outros objetos, apagando as luzes, etc. Embora algumas vezes chegue a conseguir arrumar a sala, em geral o resultado é pequeno ou insignificante, quase um trabalho de Sisifo. Nossa empregada é que é grata por isso.
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Fazia muito tempo que não sentia o quanto somos vulneráveis a qualquer acidente, doença, etc., que possa acontecer a Silvia. Foi o que ocorreu ontem, quando ela acordou com uma dor na altura dos rins que, ao longo do dia, aumentou e se espalhou para outros pontos do seu corpo. Como estávamos sozinhos com Clara, era domingo de carnaval, muita gente a quem podíamos recorrer tinha viajado, no dia seguinte suas filhas voltariam da casa do pai e a empregada não viria trabalhar, comecei a temer que a situação se tornasse emergencial, me comuniquei com nossa diarista e a deixei de sobreaviso – como se acha a Mulher Maravilha e resiste a admitir ajuda externa, Silvia não gostou dessa atitude. Felizmente, hoje a dor praticamente acabou, mas ainda estou preocupado com a possibilidade de Silvia estar com um problema que exija uma cirurgia, por menor que seja.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Desde que comecei a usar uma máquina de escrever elétrica em 1980 – digitar eletronicamente desde 1996 –, ouço que deveria publicar um livro sobre minha vida, sugestão que nunca fui capaz de seguir, não sei exatamente porquê e os motivos que darei a seguir podem ser mera confabulação, ao menos em parte.
Jamais achei que minha história valesse um livro antes de casar com Silvia e ser pai, embora antes a paternidade me apavorasse. Essa razão ficou clara ao refletir por quê o comecei só em novembro e concluir que foi então que senti que nosso casamento será duradouro, inclusive sem acabar num desastre. Naquele mês, digitei o prefácio espantosamente numa única tarde, em seguida empaquei no início do primeiro capítulo usando as férias das meninas como desculpa para parar a digitação do livro, a retomei na última semana, fiquei uns quatro dias reclamando que estava penosa, travada, difícil até que, na sexta, adquiriu ritmo próprio, uma lógica interna. Nesse processo, descobri outros possíveis motivos do bloqueio: detestei minhas infância e adolescência, guardei pouquíssimas lembranças destas e até me é desagradável tentar recorda-las; não gosto nada da ideia de expor os assuntos da minha família – isto é, pais e irmãos, pois Silvia já me liberou para falar de tudo; e estabelecer um ponto inicial.
Estimulada por eu ter começado o livro, Silvia ensaiou escrever um seu e, ao comparar ambos os esboços, comentou que meu estilo é mais descritivo e objetivo. Tal comentário me deu dois maus pressentimentos: que meu livro não chegará às cem páginas e vai encalhar, não vai vender um único exemplar, porque vai faltar sentimento – sou muito bom em descrever e compreender processos psicológicos, o que já encantou inúmeras psicólogas, mas sempre naquele estilo. Mas não há como saber se o livro será um fracasso ou sucesso, primeiro preciso digita-lo – depois é que vou pensar como o publicar, vender, etc.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Sempre me encarregaram de comprar passagens aéreas, mas desde que as empresas de aviação criaram limite de tempo para as sessões de compra isso se tornou extremamente difícil. Mesmo que, em outras condições, consiga digitar a quantidade exigida de dados no tempo determinado, a mera existência desse limite me deixa tenso e aumenta minha espasticidade, me impedindo de terminar a tarefa no prazo estipulado. Nas últimas vezes que tentei, fracassei e fiquei irritado demais – nesta terça, saí do computador batendo nas coisas ao meu redor.
Em Banco 30 Segundos, reclamei de ter de digitar um código de segurança em tão pouco tempo. Felizmente, depois o Itaú desenvolveu aplicativos que embutem o gerador desses códigos, resolvendo o problema.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Ontem à noite, quando Clara ia dormir falei algo remotamente parecido a “beijo” virando o rosto e apontando para minha face, o que ela entendeu perfeitamente e me beijou. A convivência reduz a importância da fala na comunicação.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Agora, temos conseguido que Clara me beije ou abrace quando sai para o colégio e vai dormir – ontem, a derrubei enquanto me abraçava, o que não posso deixar que se repita para ela não mudar tal comportamento. É uma reaproximação ainda tênue, pois Clara ainda não me permite acaricia-la, mas me alegra.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Algum tempo após começar a beijar, Clara deixou de me dar beijos porque se machucou com meus óculos e descoordenação motora várias vezes. Hoje, espontaneamente ela me deu muitos beijos sabendo evitar os óculos, o que foi uma alegria para mim. Ela está aprendendo a lidar com minhas limitações.