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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Um dos assuntos mais recorrentes deste blog era Clara recusar que eu a acariciasse – pode-se acompanhar como e porquê tal problema surgiu, se desenvolveu e declinou. Nesta semana, ela me pediu para a acaricia-la com frequência e até insistência, apesar de todos arranhões, trombadas, patadas que dei involuntariamente nela, além de ter perdido uma mecha inteira de cabelo. Obviamente, foi necessário anos de esforço e atenção para controlar minha descoordenação motora ao lidar com ela. Estou feliz por ter tido sucesso.
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Nesta manhã, quando minha fisioterapeuta chegou Silvia tinha levado suas filhas e resolvi que Clara iria conosco para a sala de pilates, de modo a não ficar enfiada nos streamers. De brincadeira, aquela fez Clara dizer que sou o rei da casa só para, em seguida, esta me montar.
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Com o arrefecimento da pandemia no Brasil, meses atrás comecei a pensar em consultar um urologista por prevenção, mas vinha relutando em dar esse trabalho a Silvia e me expor ao risco de pegar COVID-19 até sentir uma dor momentânea no períneo e adjacências – provavelmente foi muscular, mas achei melhor checar a próstata. Meu plano de saúde deu uma guia e uma indicação médica para ir a um hospital conveniado, mas eu não sabia que tinha de levar esta segunda, não pude fazer a consulta e precisei pedir a extensão da validade da guia. Quis marcar a nova consulta pelo WhatsApp, não vi que tinha que dar a confirmação final e, ao voltarmos lá na semana passada, soubemos que nada havia marcado – só fiz trapalhadas nessa história. Silvia teve de conduzir minha cadeira de rodas de ré – para as pequenas rodas dianteiras não engancharem nas lajes da calçada – por uns 80 difíceis metros, além de subir uma rampa bem íngreme, para irmos a outro prédio do hospital, cujo atendente conseguiu me encaixar nos horários de um urologista, que chamou outro – que ela já conhecia e confia mais – para fazer o exame de toque e até hoje tenho que aguentar as piadas dela a esse respeito. Foi detectada uma dilatação na minha próstata, que lembrei que há anos é mostrada em ecografias, mas esqueci que a primeira destas foi em 2014 – devia ter me lembrado desse detalhe, pois foi um episódio que poderia ter me impedido de casar e ser pai. Hoje solicitei os outros exames e espero não fazer mais besteira alguma.
Sempre vetei animal de estimação aqui em casa, por saber que seria mais um trabalho para Silvia. No meio do ano, uma vizinha teve de se mudar às pressas para outro estado e pediu que Silvia ficasse com sua gata preta, embora com a proposta de repassa-la para outra pessoa, o que já me irritou imediatamente. Um mês depois, todos da família tivemos uma doença respiratória, com o consequente é-não-é COVID – não era e, como todos usamos máscara ao sair, a causa devia estar em casa, na gata. Nossa empregada chegou a arranjar alguém para ficar com a gata mas, na hora H, Silvia e sua segunda filha a retiveram e, então, eu disse que daria um sumiço no bicho se mais um membro da família adoecesse – não faria crueldade alguma, só a empurraria para outra pessoa. Na semana passada tive uma asma estranha, já que nenhum dos fatores habituais – doença respiratória, fumaça e poeira – esteve presente e o motivo foi a gata ou a falta da natação. Concedi o benefício da dúvida à gata, resolvi fazer natação por um mês – mais que isso é inviável para Silvia – e já na primeira sessão percebi que a fisioterapia não pode substituí-la. Após uma noite em que dormimos mal devido à gata, a própria Silvia quis se livrar do bicho, mas não teve coragem para tanto, me perguntou se teria e, pela minha expressão facial, viu que sim. Pelo bem da gata, espero que a natação funcione.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Esta sessão de fisioterapia foi em maio e a filmagem ficou esquecida até hoje, porque foi no dia em que a segunda filha de Silvia testou positivo para COVID-19 e o consequente susto. Está ficando difícil usar Clara como “aparelho de ginástica”, pelo seu crescente peso – no “cavalinho” venho tendo cada vez mais medo de dar uma queda nela. O vídeo evidencia seu hábito de me fazer de brinquedo, aprendido com a mãe
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No primeiro dia deste mês, fomos ao colégio de Clara para assistir uma apresentação de sua turma. Ao me ver, a coordenadora contou que Clara tinha falado antes que eu iria, após o evento ela subiu no meu colo, alegremente chamou a atenção dos colegas para estar nele e me locomover de cadeira de rodas – talvez se sentisse como se estivesse num trono. É nítido que Clara se orgulha de mim e, embora tenha perfeita consciência das minhas limitações físicas, as encara como dados da natureza, neutros ou até bons – como andar no meu colo na cadeira de rodas –, ainda não desenvolveu o conceito de “deficiência” e muito menos imagina os significados que tem na sociedade. Passei os últimos dias preocupado com o choque de realidade que Clara levará daqui a alguns anos, já que consideramos inevitável que sofra bullying por ter um pai com paralisia cerebral e, por enquanto, não sei o que fazer para atenuá-lo.
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Nesta tarde, fiquei com Clara para Silvia conseguir trabalhar. Para escolher um vídeo do YouTube, Clara veio à varanda, se abaixou ao lado da minha cadeira, meu braço direito – o mais descontrolado – teve uma contração involuntária, o dedo apontador enganchou num cacho de seus cabelos e literalmente o arrancou. Doeu bastante, ela chorou muito mas, quando a dor passou, não ficou com raiva, tristeza, ressentida comigo – ao contrário, me tratou com mais gentileza, foi mais carinhosa comigo, como se quisesse evitar que me sentisse culpado. Ela já sabe que quem tem um pai com paralisia cerebral corre o risco de se machucar seriamente – Silvia às vezes brinca que tenho uma “mão assassina” (a direita) com vontade própria, da qual já levou várias pancadas. Fico mal com esses incidentes.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
No início de agosto, o colégio de Clara convidou um membro da família – pela pandemia e por muitos pais terem emprego – para uma aula aberta em comemoração do Dia dos Pais. Com medo de contágio por COVID-19 e pelo esforço de me levar, Silvia quis ir sozinha, mas em todos os eventos desse tipo da sua antiga escola Clara tornou-se a criança mais feliz da sua turma ao me ver chegar, teimei em comparecer e conversei com a coordenadora, que disse que, no nosso caso, ambos os pais poderiam ir – na verdade, a escola nos deu todo o suporte necessário. E, de novo, Clara ficou exultante com minha presença.
Basta acompanhar este blog para perceber o quão me sinto feliz e orgulhoso em relação a Clara e só não gosto de ela mandar e desmandar nas irmãs, ser egocêntrica demais com as duas. Nos meus desvaneios a esse respeito, cheguei a pensar que ela está com a “síndrome de imperador”, mas as avaliações que recebemos do colégio mostram que não tem tal comportamento fora da família. Este é um assunto cada vez mais recorrente nas minhas conversas com Silvia, que não quer tomar uma atitude mais drástica porque teve ela própria muita dificuldade de se impor na infância, enquanto raramente consigo agir rápido o suficiente para corrigir Clara nas ocasiões em que esse problema emerge.
Nos últimos meses, tenho notado bastante que Clara sempre está alegre, feliz, brincando, e o slide abaixo indica que tive um forte papel no desenvolvimento dessa característica; às vezes Silvia fala que um dia vai me encontrar amarrado com Clara cantando em volta, como os índios dos filmes de faroeste. Alguém mais conservador, ao ver esse slide, poderia imaginar que não devo ter moral com as meninas, mas ao menos em algumas ocasiões tenho mais autoridade com as três do que Silvia: p. ex, hoje de manhã ela passou um bom tempo dizendo para sua segunda filha se vestir para ir à escola sem que esta se mexesse, entrei no quarto, falei o mesmo e fui prontamente atendido – fico surpreso por ter essa autoridade apesar da dependência física e econômica.
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