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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Em 1998 fiz amizade com um empresário carioca que viu meu site, cujo pai (já falecido) tinha paralisia cerebral e, num momento muito difícil, ele passou a me ajudar financeiramente, o que via como um prolongamento de seu amor por este, embora nunca tenhamos nos encontrado pessoalmente. Há dois anos, ele não pôde mais me ajudar informalmente e decidiu criar um blog patrocinado sobre PC. Era para ser um coletivo, cujo conteúdo seria produzido não só por gente com PC, mas também por pais, médicos, fisioterapeutas, etc, desde que os textos fossem sempre em primeira pessoa, que ele próprio iria arranjar, enquanto eu apenas ficaria com a administração e só escreveria eventualmente. Na época, tinha parado de escrever há muito tempo, me sentia totalmente sem inspiração para tanto e fiz tudo para me esquivar de produzir o conteúdo. Porém, esse amigo nunca teve tempo para conseguir colaboradores e, muito a contragosto, acabei como o único responsável pelo blog.
A inspiração acabou surgindo do meu cotidiano e, nos últimos meses, da mulher que amo. A intenção é mostrar uma pessoa com PC como alguém de carne e osso, com dúvidas, problemas, vitórias, conquistas, desejos, frustrações, etc, inclusive abordando aspectos polêmicos e obscuros. O nome do blog é uma alusão à ideia de que pessoas com PC são incapazes de pensar. Evito ao máximo postar conteúdo de terceiros. Me nego terminantemente a fazer o discurso da “superação” e a encarnar o papel de herói, super-homem, lição de vida e outros correlatos.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Pode haver sensualidade num casal constituído de uma grávida de cinco meses e um homem com paralisia cerebral?
A tradução da frase da camiseta com a qual eu estava é "estar inspirado é ótimo, inspirar é incrível".
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
A boa acessibilidade de Curitiba não chega aos seus motéis. Silvia e eu já fomos ao Acqua e ao Você Que Sabe. As suítes não têm adaptação alguma para pessoas com deficiência, embora isso não tenha nos atrapalhado porque, como faço em casa, me locomovi engatinhando, subi e desci da cama sozinho, e quando precisei tomar banho e ir ao banheiro, Silvia o fez sem grande dificuldade. O problema foram as escadas estreitas, íngremes e com corrimão só de um lado que ligam as garagens às suítes – subi-las até não foi muito difícil, mas descê-las foi perigoso demais e tive de me esforçar para manter a calma para não acentuar a espasticidade (rigidez muscular). Parece que essa falta de acessibilidade não é exclusiva desses dois, pois nesta lista de motéis adaptados nenhum é de Curitiba.
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Contínuo achando que isso não vai dar certo, vou é machucar nossa filha, mas Silvia insiste que tenho de pega-la logo após o nascimento.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Ter pensado no que poderia dar errado na época do parto de Silvia trouxe à tona preocupações antigas, anteriores à minha mudança para Curitiba, e novas. Uma das razões para ter ficado assustado ao decidir vir para cá é que Silvia teria de cuidar de três dependentes, aos quais se juntará uma recém-nascida em junho. Meu plano de saúde tem alguma assistência médica domiciliar – mas se tiver de me hospitalizar, quem ficará comigo no hospital e/ou com as meninas? Se uma destas adoecer, quem cuidará das outras? E, mais grave de tudo, se a própria Silvia tiver algo sério, como nós quatro vamos nos haver? Por enquanto, não sabemos.
Alguns posts deste blog têm feito muita gente nos oferecer ajuda e atenuado tais preocupações, mas enfrentamos o desafio de saber como lidar com esses riscos e minimiza-los.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
É bem comum mães de pessoas com paralisia cerebral – e outras deficiências –, especialmente as religiosas, pensarem que a finalidade da deficiência seja manter o filho puro, virgem, angelical, assexuado. Quando ainda era católica, às vezes a minha desejava que eu fosse padre – quem me conhece o mínimo pode rir dessa ideia. Após se tornar espírita, passou a argumentar que a espiritualidade tinha dado a PC para me vetar o sexo.
Em meados da década de 1980, fiz o meu primeiro amigo e logo pensamos em este me levar a prostíbulos. Isso tornou muito tenso o relacionamento com minha mãe, que chegou a ameaçar me trancar em casa e eu, retaliar com uma greve de fome. Ela foi se aconselhar com um médium do seu centro espírita, que falou que eu deveria esperar que uma mulher transasse comigo por amor, conselho que considerei idiota, pois minha princesa encantada poderia muito bem nunca aparecer, além de depender da suposição heroica de minhas virgindade e inexperiência sexual não atrapalharem de várias formas a relação com tal mulher. Ela só aceitou que eu transasse doze anos depois, quando em ejaculações involuntárias noturnas meu semem saiu com sangue – a primeira coisa em que pensamos foi câncer de próstata, mas o diagnóstico foi escamação da vesícula seminal por acúmulo de líquido, isto é, falta de sexo.
A ideia de ir a prostíbulos com meu amigo também incomodou muito meu pai, que imaginava que se eu não experimentasse sexo nunca iria querer faze-lo – o mero fato de eu ter tido aquela ideia já demonstra que ele estava enganado. Outro motivo desse incômodo era que ele se sentia no dever de fazer minha iniciação sexual, mas, por algum motivo que desconheço, ficou com aversão a prostíbulos e/ou lidar com prostitutas. Porém, sempre rejeitei ir a tais lugares com ele e tudo que eu queria era que infundisse algum bom senso e flexibilidade na minha mãe.
Hoje, tudo que passei na década de 1980 é muito irônico e até me faz rir, pois, ao menos por enquanto, sou o filho mais “bem casado” e darei uma neta a eles – o que minha mãe me cobrava desde 2004, quando tive outra namorada linda – e, sem a experiência que acumulei muito mais com prostitutas do que com outras mulheres, é bem possível que meu relacionamento com Silvia fracassasse.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Minha fisioterapeuta e Silvia inventaram de me fazer treinar para pegar nossa filha, usando uma boneca:
Acho uma ideia de jerico e não pretendo pega-la antes dos três meses, enquanto Sílvia quer que isso aconteça no primeiro dia.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Neste sábado, perto da meia noite Silvia sentiu-se mal e fiquei com a cabeça girando, imaginando como e a quem pedir ajuda se seu estado se agravasse, em especial se ela desmaiasse. Após ela compartilhar o último post no Facebook, várias amigas e primas dela ofereceram ajuda, mas não sei se alguma estaria com o celular ligado naquela hora. Provavelmente ela ligaria para alguém antes de piorar muito, mas, se fosse eu que pedisse ajuda e estivesse sem óculos, teria dificuldade para digitar mensagens. Se ela fosse a um hospital sem conseguir falar com ninguém e suas filhas acordassem, conversaria com estas usando o Livox e, de manhã, enviaria uma mensagem ao seu ex-marido pedindo que viesse busca-las, apesar de ele não querer contato algum comigo. Só não saberia como atender o interfone se alguém chegasse à portaria para nos ajudar, caso ela não pudesse faze-lo.
Silvia só deve ter tido cólicas e cansaço e melhorou em 90 minutos. No dia seguinte, tive a ideia de avisar a portaria que deixe passar qualquer pessoa que diga que estamos numa emergência, embora isso tenha seus próprios riscos. E a pessoa que banha minhas enteadas e eu falou que deixa o celular ligado durante a noite. Mesmo assim, é uma situação muito vulnerável.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Minha filha deve nascer no fim de junho de parto cesariano, o que implica um período de recuperação de 30 a 40 dias para Silvia. Suas duas filhas entram de férias em seguida e é incerto em que medida seu ex-marido poderá efetivamente compartilhar a guarda destas, por ter uma saúde precária e às vezes correr risco de vida. Sua família mora em Brasília e ficou só de pagar uma enfermeira para ajuda-la nos primeiros dias da recém-nascida. Meu irmão tinha prometido vir para Curitiba no meio do ano, mas recentemente voltou a trabalhar e, até uma semana atrás, me parecia duvidoso que pudesse vir de fato. A única pessoa com quem aparentemente poderíamos contar seria minha irmã mais velha, que ficou de passar uma semana aqui na época do parto.
Nessas condições, no último sábado conversamos sobre a possibilidade de haver uma emergência, como o rompimento da bolsa d’água. Não soubemos quem cuidaria de suas filhas e de mim, a levaria ao hospital e se haveria alguém para ficar lá com Silvia. Se apelássemos a um amigo, ele poderia demorar para chegar e se chamássemos um taxi, este ficaria na portaria e ela teria de andar uns 50 metros, subindo e descendo escadas e/ou rampas. Seria uma situação muito perigosa para Silvia e nossa filha, chegamos a pensar que eu poderia ter de voltar para Recife – o que só resolveria parte dos problemas –, ela começou a chorar pois quer que eu esteja presente inclusive na sala de parto até que falei “não vou (para Recife)”, embora estivesse ciente de que tal negação talvez não passasse de uma bravata.
Felizmente meu irmão disse que poderá passar um mês em Curitiba, minha irmã estará aqui na ocasião do parto e uma amiga minha virá antes desta, de modo que, nas semanas anteriores ao parto, haverá sempre alguém aqui a postos para o caso de surgir uma emergência; Silvia já deixou uma amiga de sobreaviso para essa eventualidade; e na última consulta com seu ginecologista, eu quis definir logo uma data para o parto, para irmos nos planejando.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Pedi a Silvia para conhecer o cento de Curitiba no último sábado. Fiquei muito surpreso por ser possível andar de cadeira de rodas pelas ruas dele sem problemas, em contraste com a falta de acessibilidade da grande maioria das ruas do de Recife. Mas a grande maioria das lojas e restaurantes da região não tem rampa de acesso. E repeti a demência de subir um degrau alto de um restaurante na cadeira, esquecendo que podia me levantar, subir com minhas próprias pernas e depois Silvia subir a cadeira com bem menos esforço – que imbecilidade!