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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Passei dez anos tentando abrir uma conta corrente no meu nome sem conseguir, pois não tenho coordenação motora para colocar uma assinatura no contrato, não aceitavam que esta fosse substituída pela impressão digital, exigiam que o contrato fosse assinado pelo meu represente legal, que era meu pai, cujo nome estava com restrição no sistema bancário. Só tive sucesso quando o Bradesco passou a aceitar tal substituição através da “assinatura a rogo” de duas testemunhas – abri a conta no Itaú, que tem uma agência no quarteirão em que moro, ensinando esse expediente e dizendo que um concorrente o aceitava.
No ano passado, uma irmã me pediu para tirar um empréstimo no meu nome para ela comprar um carro e, ao ver o contrato da conta, a gerência da minha agência – que mudou várias vezes desde a abertura da conta, em 2007 – disse que o contrato estava ilegal porque não o assinei e exigiu que eu nomeasse um procurador para assina-lo, sob pena de fechar a conta. Fiquei furioso, não ia nomear um procurador e deixei tudo pronto para me mudar para o Bradesco, mas a gerente se esqueceu do assunto, não sei se por conveniência. Há um mês, me comuniquei com os principais bancos brasileiros, exceto o Bradesco, para saber o que fariam se uma pessoa impossibilitada de assinar quisesse abrir uma conta: a diretriz do Itaú é exigir um procurador, mas dá autonomia aos gerentes de agência para aceitarem assinatura a rogo; o Santander exige um procurador; o Banco do Brasil ligou para um gerente de agência e me encaminhou para lá; o HSBC não soube o que fazer e a Caixa Econômica Federal não respondeu. Também pesquisei a legislação sobre acessibilidade bancária e nada encontrei a esse respeito. Parece que, exceto pelo Bradesco, quem não pode fazer uma assinatura continua excluído do sistema bancário ou – o que acho um risco – tem de se submeter a nomear um procurador.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Há três dias, fui com duas amigas a um show no Chevrolet Hall, em Olinda, e gostei da acessibilidade do local e do bom treinamento dos funcionários para lidar com pessoas com deficiência, inclusive para tomar a iniciativa de oferecer ajuda – mas esqueceram de fazer banheiros unissex para tais pessoas. Quando acabou o show e a adrenalina baixou, precisei urinar com urgência e uma dessas amigas passou pelo constrangimento de entrar comigo no banheiro masculino, que felizmente já estava vazio.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Como não posso andar sem ajuda, em casa me locomovo engatinhando, o que de vez em quando faz a parte superior dos pés, dos dedos das mãos – é difícil engatinhar com estas abertas – e, sobretudo, os joelhos se ferirem ou terem pequenos tumores. Nessa situação, passo a me locomover sentado, o que também pode ferir a parte de fora dos pés – aí o jeito é ficar pedindo aos outros para me ajudarem a andar. O uso de joelheiras, meias e luvas me incomoda demais, principalmente quando a temperatura está alta, e é extremamente eu aceitá-lo. Ainda tenho de tomar cuidado para os outros não tropeçarem em mim e caírem – foi assim que minha mãe fraturou o fêmur.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Minha paralisia cerebral é tetraplégica e tenho espasticidade, ataxia e atetoide. Devido aos dois últimos distúrbios motores, meu braço direito é tão descoordenado que quase sempre procuro mante-lo imobilizado e qualquer carícia que eu queira fazer é com a mão esquerda. Meus beijos são molhados porque tenho pouco controle da salivação. Exceto quando uso a língua – o que, dizem algumas mulheres, faço muito bem, o que é surpreendente porque a mastigação e a deglutição são difíceis por não controlar direito a língua –, sou a parte passiva durante o ato porque a excitação acentua a descoordenação, embora já tenha sido capaz de ser ativo em algumas posições. Tomo o cuidado de cortar as unhas, para não ferir minhas parceiras sem querer. Já que não consigo falar e não é nada bom parar a coisa no meio para dizer o que está ruim, quando vou transar com uma mulher pela primeira vez digito um bilhete para ela dizendo o que gosto fazer ou não, como fazer, as melhores posições, etc – e depois, preciso que ela seja aberta pra conversar francamente comigo sobre o que foi bom ou ruim. O título do meu site é "Dedos dos Pés" porque uso o computador, o tablet e a prancha (de madeira) de comunicação com os dedões dos pés, os quais podem ser vistos como "objetos fálicos" que podem desencadear fantasias, o que já fez algumas mulheres me pedirem para usa-los nelas, com ótimos resultados!
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Em 2011, decidi tentar saltar de paraquedas e voar de parapente, asa delta e ultraleve. Desde então, dei dois saltos de paraquedas e um voo de parapente motorizado, parte do qual com o motor desligado. Perdi um pouco do interesse por ultraleve, mas ainda quero voar de asa delta. O problema é que, na decolagem, o passageiro também tem de correr para não sobrecarregar o instrutor e sequer consigo andar sozinho. Na semana passada, perguntei a um instrutor se uma terceira pessoa poderia ajudar na decolagem, mas ele respondeu que seria arriscado demais. Já vi asa delta decolar de cima de um carro em movimento, mas não existe isso aqui em Pernambuco nem nos estados vizinhos. Parece que estou num beco sem saída.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Andar de taxi sozinho sem poder falar e andar sem ajuda pode ser bem complicado. Sempre prefiro andar com taxistas conhecidos, mas atualmente perdi contato com quase todos. Quando estou entrando no taxi, dou um jeito da pessoa a quem encontrarei falar com o taxista explicando como chegar onde ela estar ou digito antes um texto com tal objetivo. Digitar esse texto implica uma série de dilemas entre detalhamento e simplicidade, e às vezes não é bem entendido pelo taxista. Para o caso de acontecer um acidente, levo um papel plastificado com meu nome, endereço, descrição da minha deficiência e os contatos da minha família e, quando uso o Easy Taxi, peço que minha cuidadora anote o celular e a placa do taxi – foi difícil convencê-la da necessidade de anotar esses dados, pois o único risco que esta conseguia pensar era sequestro, crime para o qual sou um alvo improvável.
Na última sexta, fiz um pedido pelo Easy Taxi para ir ao Centro Elohim de Equoterapia, o texto que levei presumia que quem o lesse saberia onde fica o Parque de Exposição do Cordeiro ou pelo menos a Av. Caxangá, mas o taxista que veio era de outra cidade, vi que o aplicativo de navegação dele deu uma rota bem errada e voltar para casa não era uma boa ideia, pois a única pessoa que tinha ficado nesta era minha mãe, que já é muito idosa e não pode mais subir a escada comigo. Por um momento fiquei assustado –“e agora?!” – mas esse taxista era um jovem de mente aberta, não pressupôs que eu tivesse déficit cognitivo e conseguiu se comunica comigo bem o suficiente para eu ir apontando o caminho até lá. Ufa!
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Quando deixam de poder me atender, a maioria das fisioterapeutas procura falar diretamente com a que vai substitui-las para informa-la sobre o trabalho que desenvolveu, mas algumas não têm essa preocupação. Para a nova profissional não começar a trabalhar comigo às cegas, ensina-la como me comunico e dar outras informações, imprimo e entrego a carta abaixo:
"Minha paralisia cerebral é mista – tenho espasticidade, ataxia e atetóide, sendo esta concentrada no braço direito. Portanto, os exercícios devem ser em cadeia cinética fechada, exceto quando você quiser fazer algum para atetóise. Meu joelho esquerdo é virado para dentro, minhas pernas não se estendem completamente, o ombro direito é bem anteriorizado e meus pés ficam para fora quando fico em pé. O que me levou a voltar a fazer fisioterapia foi o aumento da espasticidade devido ao avanço da idade e dores e eventuais distensões nas costas, ombro direito e lado direito do pescoço, causadas por um desvio de coluna e pela posição na qual uso o computador.
Minhas pernas já subem 70 ou 80 graus.ao alongar a parte posterior. Para alongar bem a parte posterior da perna esquerda você precisa forçar o joelho para fora, senão a força vai para o lado interno deste. Será necessário que lhe dê algum feedback sobre o alongamento das pernas, porque acertar isso não é trivial. O que mais alivia minha coluna é o alongamento de costas na bola. Á melhor forma de me segurar para andar comigo e fazer exercícios em pé é me segurar por baixo dos braços, com suas mãos próximas aos meus cotovelos, de frente para mim – creio que esse forma é ensinada a todos os fisioterapeutas (não é assim que ando no cotidiano, mas essa outra forma é viciada).
Para conversar pessoalmente, uso uma prancha com letras e números que você verá amanhã. No fim de cada palavra que formo na prancha com a qual me comunico dou uma pausa, na qual você deve repeti-la em voz alta ou, se for inconveniente que outros ouçam, fazer algum gesto, para que eu saiba que entendeu a palavra ou não. Se você perceber a palavra que estou formando antes de terminá-la, deve falar no mesmo instante para agilizar a conversa. Meu tablet está dando problema e pode ser bom me adicionar no Facebook, onde estou como Ronaldo Correia Junior, para a eventualidade de eu ficar sem o WhatsApp. Tenho um site – www.dedosdospes.com.br – e um blog – www.cerebropensante.com.br – que creio que você achará interessante ler."
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
Nesse artigo, Fabiano Puhlmann diz que as pessoas com paralisia cerebral “frequentemente são superdotados na inteligência”. Desconsiderando os casos em que a lesão afeta as partes do cérebro responsáveis pela cognição, não há motivo para supor que a distribuição de Q. I. ou qualquer outra medida de inteligência – todas sujeitas a controvérsias – entre tais pessoas difira do resto da população. Assim, dizer que há uma maior incidência de superdotados entre elas decorre da surpresa de sua “normalidade” nesse aspecto quando se espera que todas, ou na grande maioria, tenham déficit cognitivo. É um resquício de preconceito muito comum – estou cansado de ouvir que sou superdotado ou gênio (não sou) e usei o artigo de Puhlmann apenas como um exemplo que estava disponível.
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- Escrito por: Ronaldo Correia Junior
O que mais me incomoda nesse artigo de Fabiano Puhlmann sobre sexualidade na paralisia cerebral é chamar a prostituição de "sexualidade marginal". Todos os psicólogos que falam sobre sexualidade procuram ter uma atitude neutra, evitando condenar qualquer prática disseminada, deixando cada pessoa livre para fazer suas escolhas conforme seus desejos e valores. Em contraste, num grupo do Facebook vi a também psicóloga Carolina Câmara, que tem paralisia cerebral, notar a falta de garotos de programa especializados em atender mulheres com deficiência física.