Em 2004, escrevi um manual para ensinar as mulheres que iam encontrar-se comigo em Recife pela primeira vez como lidar com minhas limitações físicas, o qual atualizei e enviei a Silvia antes do nosso primeiro encontro. Nas conversas que antecediam tais encontros, também me esforçava para dar uma noção clara dessas limitações. E Silvia tinha passado por situações extremas com as doenças do primeiro marido. Tudo isso me fez supor que ela teria certa facilidade para começar a lidar comigo concretamente – não foi o que aconteceu.

Nos primeiros dias, Silvia sequer conseguia entender o que eu dizia com a prancha de comunicação, precisando conversar comigo através do meu irmão, até que ensinei os macetes pelo WhatsApp. Ficava meio apavorada quando estava aprendendo a me dar líquidos (água, cerveja, vinho, etc), com medo de me engasgar. Temia me cortar feio ao fazer minha barba. O pior foi o box do banheiro ser completamente inadequado a mim, pois o piso escorregadio, as barras e torneiras nas paredes e as saboneteiras nos cantos me impediam de ficar de pé encostado na junção de duas paredes, como fazia em Recife – após tentarmos várias soluções, resolvemos o problema com uma cadeira de banho emprestada por uma conhecida dela.

Em março de 2015, Silvia residia num apartamento diferente do que moramos e contratou uma cuidadora para dormir comigo após meu irmão voltar para Recife, mas esta não apareceu. Propus dormir sozinho, ideia que o deixou muito intranquilo e ela se comprometeu a dormir comigo, o que a causou vários transtornos, embora fosse o que desejávamos de fato.

Sempre ficava um pouco constrangido quando me encontrava com uma namorada pela primeira vez, mas, por algum motivo que até hoje desconheço, a intimidade que já tinha com Silvia desapareceu por completo ao vê-la no aeroporto, fiquei totalmente sem jeito. Essa falta de intimidade – que só reapareceu após a volta do meu irmão – e a percepção da sua dificuldade de lidar comigo me faziam ficar tenso, nervoso, o que aumentava minha espasticidade (rigidez muscular), portanto minha descoordenação motora, agravando as coisas para ela.

Diante da perplexidade de Silvia com o que ocorria, tentei acalmá-la dizendo, no WhatsApp, algo como “com experiência e amor tudo há de se resolver”, embora temesse que nosso primeiro encontro acabasse mesmo em fracasso – na noite anterior ao retorno do meu irmão, me senti obrigado a perguntar a ela se era melhor voltar com ele, torcendo para a resposta ser “não”. Estávamos apaixonados, com grandes expectativas, já havíamos enfrentado muita barra pesada na vida, assumido riscos consideráveis e não desistimos com aquele início difícil.

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