Possivelmente a maior questão existencial para quem tem paralisia cerebral e sua família é se há ou não déficit cognitivo – ou “deficiência intelectual”, na terminologia padrão – ou, caso negativo, como demonstrar que não existe. A suposição que tal déficit exista muitas vezes chega a níveis inacreditáveis. A psicóloga com quem fiz terapia trabalhou para uma escola inclusiva que tinha um aluno de dez anos com PC cuja mãe também era psicóloga e fazia trabalho voluntário para pessoas com deficiência, devido à experiência comigo ela se sentou na mesa dele e conseguiu se comunicar com o menino, mostrando que sua cognição não foi afetada, o que gerou uma forte comoção na mãe e no pessoal do colégio. Tive uma namorada virtual que estudava Psicologia que fazia um estágio numa clínica de reabilitação, a qual tinha um paciente com PC de 17 anos que ainda usava fraldas, pois sua família pensava que não aprenderia a controlar os esfíncteres, o que essa namorada ensinou em pouco tempo após perceber que o intelecto deste era normal.
Atribuir um déficit cognitivo imaginário pode ser um modo de denegrir a imagem de alguém com PC ou que tenha um filho com essa deficiência. Já vi duas amigas que trabalhavam em reabilitação terem tal atitude, no primeiro caso quanto a um rapaz que frequentou uma instituição da área, no segundo em relação à filha de uma pessoa de quem não gostava. Creio que não eram mentiras intencionais dessas amigas, e sim distorções na sua percepção causadas pela animosidade com essas pessoas.
Tenho dois amigos muito esclarecidos cujos filhos com PC têm déficit cognitivo, mas que parecem não falar disso de modo algum. Conheço pessoalmente o filho de um deles e o que me chamou a atenção foi a omissão desse aspecto da deficiência, mas só consegui concluir pela existência do déficit no filho do outro amigo analisando seu discurso.
O tipo de situação descrito no primeiro parágrafo é bem comum. Não sei com que frequência ocorrem as atitudes mencionadas no resto deste post.
Apoie este blog pelo Pix